Rol Taxativo da ANS: o que o paciente precisa saber

Rol Taxativo. Essa foi a decisão a que chegaram, por maioria de votos, os ministros da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento que tratou sobre a natureza do Rol de Procedimentos da ANS.

Em minutos, a decisão ganhou as manchetes e a tradicional disseminação nas redes sociais, muitas vezes levando desinformação e propiciando desespero (compreensível) entre centenas de milhares de pacientes e familiares em todo o país.

Mas é importante entender de fato o que está ocorrendo e que, não, os pacientes não estão desamparados. Ao contrário, mais do que nunca o suporte jurídico de um advogado especializado na área de saúde será fundamental.

Advogado Especializado em Plano de Saúde

O que é o Rol de Procedimentos da ANS

Segundo definição da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde consiste na lista dos “(…) procedimentos considerados indispensáveis ao diagnóstico, tratamento e acompanhamento de doenças e eventos em saúde, em cumprimento ao disposto na Lei nº 9.656/98”1.

Em outras palavras, a ANS edita periodicamente uma lista de procedimentos que passam a ser automaticamente de cobertura obrigatória pelos planos de saúde.

Ocorre que a medicina de uma maneira geral evolui de forma muito mais rápida do que as atualizações da ANS que, além de tudo, são pautadas por premissas econômicas, o que resulta numa sistemática defasagem entre a disponibilização de novas técnicas, medicamentos e tratamentos e a efetiva incorporação dos mesmos à lista de procedimentos de cobertura obrigatória.

Este constante descompasso entre a realidade da prática médica e os aspectos formais e burocráticos da agência reguladora ensejam inevitáveis conflitos entre pacientes (que legitimamente buscam o tratamento mais adequado), e as operadoras de planos de saúde (que sustentam somente serem obrigadas a cobrir os procedimentos e tratamentos previstos expressamente no rol).

Qual a posição histórica do Judiciário sobre o Rol da ANS

O ponto de discussão é simples: os planos de saúde são obrigados a cobrir procedimentos não previstos expressamente no rol da ANS? Em outras palavras, o rol da ANS é taxativo ou exemplificativo?

De forma geral, o entendimento que sempre prevaleceu no Judiciário é de que o Rol da ANS tem um caráter meramente exemplificativo, constituindo referência das coberturas mínimas obrigatórias, mas não excluindo outras que se façam necessárias, por expressa indicação médica, para o tratamento de doença coberta contratualmente.

Em outras palavras, se a doença é coberta contratualmente, o seu tratamento – de acordo com a indicação médica -, também o deve ser.

Sinais de mudança

Foi então que a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) protagonizou um novo capítulo nesta discussão por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 1.733.013/PR, ao sinalizar uma possível mudança de entendimento.

No caso concreto, uma paciente teve indicado, por seu médico assistente, a realização de procedimento cirúrgico para tratamento de coluna denominado cifoplastia.

A operadora do plano de saúde argumentou que autorizaria a cirurgia, porém não pela técnica proposta pelo médico da paciente e, sim, por outra técnica que inclusive estaria prevista no rol da ANS (vertebroplastia).

Em primeira instância, se determinou a cobertura do procedimento pela técnica prescrita pelo médico da paciente.

O Tribunal de Justiça do Paraná, no entanto, reformou a sentença por entender que a cifoplastia não está prevista no rol da ANS e que a verteroplastia, autorizada pela operadora, tem eficácia comprovada.

A ação judicial versou, portanto, sobre o dever de o plano de saúde cobrir procedimento não previsto no rol da ANS, quando há outro procedimento previsto e de eficácia semelhante.

Ao recorrer ao STJ, a paciente suscitou a natureza exemplificativa do rol, argumentando que deveria prevalecer a indicação do médico assistente.

O Relator do caso, Ministro Luis Felipe Salomão, considerando a relevância da matéria, admitiu a intervenção de diversas entidades na discussão na qualidade de amici curiae.

Ao final, foi então proferido acórdão, publicado no DJe em 20.02.2020 com a seguinte ementa:

“PLANOS E SEGUROS DE SAÚDE. RECURSO ESPECIAL. ROL DE PROCEDIMENTOS E EVENTOS EM SAÚDE ELABORADO PELA ANS. ATRIBUIÇÃO DA AUTARQUIA, POR EXPRESSA DISPOSIÇÃO LEGAL E NECESSIDADE DE HARMONIZAÇÃO DOS INTERESSES DAS PARTES DA RELAÇÃO CONTRATUAL. CARACTERIZAÇÃO COMO RELAÇÃO EXEMPLIFICATIVA. IMPOSSIBILIDADE. MUDANÇA DO ENTENDIMENTO DO COLEGIADO (OVERRULING). CDC. APLICAÇÃO, SEMPRE VISANDO HARMONIZAR OS INTERESSES DAS PARTES DA RELAÇÃO CONTRATUAL. EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO E ATUARIAL E SEGURANÇA JURÍDICA. PRESERVAÇÃO. NECESSIDADE. RECUSA DE COBERTURA DE PROCEDIMENTO NÃO ABRANGIDO NO ROL EDITADO PELA AUTARQUIA OU POR DISPOSIÇÃO CONTRATUAL. OFERECIMENTO DE PROCEDIMENTO ADEQUADO, CONSTANTE DA RELAÇÃO ESTABELECIDA PELA AGÊNCIA. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO. REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS. INVIABILIDADE”.

Não obstante o devido respeito aos eminentes Ministros, não se pode deixar de observar que a decisão (que altera posição jurisprudencial até então remansosa) cria no seio do Judiciário manifesta insegurança jurídica.

Prova disso é que, antes mesmo da publicação do acórdão nos autos do Recurso Especial nº 1.733.013/PR, as operadoras já vinham utilizando o julgado como referência em suas manifestações em processos em curso e, pior ainda, houve decisões judiciais3 proferidas em primeira instância adotando a posição da 4ª Turma como se vinculante fosse, o que evidentemente se mostra impertinente.

Vale pontuar que o próprio Relator do caso, Ministro Luis Felipe Salomão, sinalizou em seu voto que a “(…) dispersão jurisprudencial deve ser preocupação de todos e, exatamente por isso, tenho afirmado que, se a divergência de índole doutrinária é saudável e constitui importante combustível ao aprimoramento da ciência jurídica, todavia o dissídio jurisprudencial é absolutamente indesejável” (REsp. n. 753.159/MT)”.

A Segunda Seção do STJ se reúne

Diante da divergência de posições adotadas entre a 3ª Turma do STJ (a favor do Rol Exemplificativo) e da 4ª Turma do STJ (a favor do Rol Taxativo), uma decisão conjunta da Segunda Seção, que reúne as duas Turmas, era questão de tempo.

Assim, o julgamento de dois Recursos (EREsp 1886929 e EREsp 1889704) foram levados ao colegiado a fim de lançar precedente conjunto acerca do entendimento sobre a natureza do Rol.

Finalmente, em sessão de julgamento realizada em 08.06.2022, os ministros, por maioria de votos, entenderam que o Rol da ANS deve ser considerado como taxativo, em regra, e que os planos de saúde não estão obrigados à cobertura de procedimentos, cirurgias, exames, medicamentos, não previstos na lista editada pela ANS.

No entanto, e aqui reside o ponto principal da decisão, há hipóteses de exceção, em que procedimentos e tratamentos devem ser cobertos, mesmo não constando expressamente do Rol da ANS.

Rol Taxativo, mas com exceções

A tese firmada pela Segunda Seção do STJ, portanto, é no sentido de que o rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar é, em regra, taxativo e que a operadora de plano ou seguro de saúde não é obrigada a arcar com tratamento não constante do rol da ANS se existe, para a cura do paciente, outro procedimento eficaz, efetivo e seguro já incorporado ao rol.

No entanto, não havendo substituto terapêutico ou esgotados os procedimentos do rol da ANS, pode haver, a título excepcional, a cobertura do tratamento indicado pelo médico ou odontólogo assistente, desde que preenchidos os seguintes requisitos:

  • não tenha sido indeferido expressamente, pela ANS, a incorporação do procedimento ao rol da saúde suplementar;
  • haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina baseada em evidências;
  • haja recomendações de órgãos técnicos de renome nacionais (como Conitec e Natjus) e estrangeiros;
  • seja realizado, quando possível, o diálogo interinstitucional do magistrado com entes ou pessoas com expertise técnica na área da saúde, incluída a Comissão de Atualização do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar, sem deslocamento da competência do julgamento do feito para a Justiça Federal, ante a ilegitimidade passiva ad causam da ANS.

Rol Taxativo: o que muda para o paciente?

Como vimos, embora o STJ tenha estabelecido como taxativo o Rol da ANS, isso não significa que o paciente não tenha mais o direito de pleitear tratamentos que eventualmente não estejam expressamente previstos no Rol.

Em primeiro lugar, é importante salientar que a decisão do STJ que entende pelo Rol Taxativo não é vinculante, ou seja, não torna obrigatório que os Tribunais sigam essa posição de forma automática.

Portanto, os juízes continuam podendo decidir da forma como melhor entenderem de acordo com o caso concreto.

Em segundo lugar, a própria decisão do STJ prevê que, havendo indicação médica devidamente fundamentada sobre a imprescindibilidade do tratamento e que o paciente já esgotou as alternativas terapêuticas disponíveis, o plano deverá autorizar a cobertura e, em caso de negativa o paciente ainda pode recorrer ao Judiciário normalmente.

Nesse cenário, contar com o suporte de um advogado especialista em planos de saúde será mais importante do que nunca.

Advogado Especializado em Plano de Saúde

Em resumo

A decisão do STJ torna mais restritiva a cobertura de procedimentos, mas não impede que cada caso específico seja analisado de forma pontual, admitindo que, dadas as particularidades de cada caso, é possível obter a cobertura de tratamentos, mesmo que não previstos expressamente no Rol da ANS.

No caso de dúvidas, mais do que nunca o suporte de um advogado especializado na área de saúde será fundamental para fazer valer os direitos dos pacientes.

Ele garante mais segurança ao cliente, uma vez que esse profissional já tem conhecimento dos procedimentos e os entendimentos dos tribunais e da doutrina jurídica, aumentando a chance de sucesso. Dessa forma, procure um profissional que forneça um atendimento personalizado e adequado à cada caso, além de ser atualizado com as transformações legislativas, doutrinárias e jurisprudenciais da área médica. Com isso, as chances de se obter sucesso em um processo contra o plano de saúde aumentam bastante.

Bueno Brandão Advocacia é um escritório especializado na área da saúde, localizado em São Paulo (SP), na região da Avenida Paulista e com atuação em todo o território nacional na defesa dos direitos dos pacientes. Entre em contato conosco através do formulário abaixo e fale com um advogado especialista em saúde.

 

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